Cacaio
Cacaio

A ideia de que o futebol comporte sentimentos como gratidão ou reconhecimento é, há algum tempo já, letra morta. Não significa que as atitudes dos clubes em relação a seus empregados devam ser frias e pouco transparentes. Pelo grande trabalho executado no Remo durante a temporada, conquistando o Campeonato Paraense e garantindo o acesso à Série C, Cacaio merecia pelo menos um tratamento mais decente.

Não havia necessidade de tanta demora e mistério – em bom “futebolês”, em geral, significa “enrolação” – para definir a situação do técnico. Se não fazia parte dos planos para 2016, os dirigentes deveriam ter deixado isso claro desde o final da Série D.

Deviam avisar Cacaio, agradecer pelos bons serviços e desejar boa sorte nos projetos futuros. Tudo conforme o figurino habitual desse tipo de desligamento. Mesmo que a decisão não fosse a mais satisfatória, o treinador certamente entenderia e o clube ficaria livre do desgaste que o processo todo causou.

Constrangida em ter que despachar Cacaio, a cúpula do Remo começou um jogo de enganação que só causa mais irritação. Protelaram a reunião para discussão do novo contrato e, quando ela finalmente aconteceu, não houve maior esforço para superar o motivo do impasse: a duração do acordo.

O técnico, com base no que realizou no clube, reivindicou um contrato de 1 ano. A diretoria contrapropôs com 6 meses e daí não arredou pé. Divergências dessa ordem são absolutamente normais, tanto no futebol como no mundo empresarial. O erro foi não deixar claro que o compromisso entre as partes acabava alí – pagando, é claro, os atrasados devidos ao treinador (em torno de R$ 80 mil, segundo fontes).

Entender que a torcida acolheria “na boa” a tese galhofeira de que “a imprensa demitiu o técnico”, como declarou nesta quarta-feira (18/11) o presidente do clube, é acreditar em fadas e no saci pererê. Dirigentes de futebol precisam aprender a dar entrevistas e a esquecer o tempo em que piadinhas caíam bem diante de microfones, câmeras e gravadores.

A desculpa esfarrapada – e até desrespeitosa – apresentada pelo gestor azulino dá bem a medida da desatualização de grande parte da diretoria atual do Remo. Em nome do clube, cabia ao seu representante abrir o jogo, explicar os motivos da não renovação com o técnico e fim de papo. Vida que segue.

Empurrar com a barriga, pilheriar ou simples desconversar não resolve o problema de fundo: a forma pouco profissional como o Remo tratou um dos heróis, talvez o mais importante, da bem-sucedida temporada dentro de campo.

Blog do Gerson Nogueira, 19/11/2015