Atleta local carrega o velho estigma de falta de “estofo” para encarar competições nacionais. Para triunfar nos grandes da capital, precisa ter muita força de vontade, equilíbrio para suportar as cobranças que partem de todos os lados e contar ainda com o bom humor do treinador de plantão.
Tem sido assim desde que o futebol virou atividade profissional, lucrativa (para alguns) e remunerada. Antes, os boleiros nativos obviamente dominavam a cena, pois os clubes não tinham recursos para importar reforços.
A partir dos anos 1960, principalmente, o Pará passou a ser rota obrigatória de jogadores em fase descendente, quase sempre refugos dos grandes clubes do Sul e Sudeste. Aqui e ali, aportavam em Belém alguns atletas ainda em boa fase ou jovens em busca de oportunidade.
Apesar disso, os clubes sempre dependeram de valores locais, revelados em suas bases ou recrutados nos campinhos do subúrbio. Esse panorama vigorou até meados dos anos 1970. A partir da criação do Campeonato Brasileiro, o perfil dos elencos começou a mudar – para pior.
Os clubes passaram a priorizar a contratação de atletas de outras praças, nem sempre superiores aos daqui, mas cuja experiência em outras agremiações passou a ser vista como diferencial para a disputa das competições nacionais.
Aberrações começaram a ser praticadas a rodo, com a importação de jogadores que não deram certo lá fora, mas contratados por indicação dos técnicos e executivos, além da lábia de bons empresários, capaz de “engabelar” dirigentes pouco familiarizados com as manhas do negócio.
O tema comporta muitas análises e clama por estudos mais aprofundados, mas o fato inegável é que os jogadores regionais perderam espaço à medida que os importados invadiram massivamente o mercado local, ganhando a concorrência mesmo quando tecnicamente inferiores aos daqui.
No Remo atual, em pleno esforço de guerra para se classificar à segunda fase da Série C, o elenco tem até boa presença de atletas locais e oriundos da base azulina. Não há, porém, relação direta com o time que costuma jogar. Pesa ainda a quantidade de importações feitas por Josué Teixeira no início da competição.
Por essas e outras, Jayme, um atacante rápido e habilidoso, quase não teve vez entre os titulares – embora também tenha sofrido com lesões no período. Outra joia da casa, Gabriel Lima, autor de 4 gols, afastado por contusão, nem chegou a ser escalado por Léo Goiano.
Ainda sob o comando de Josué e depois com Canindé, Gabriel fez gols decisivos, mas era sempre preterido. Viu do banco os contestados Mikael e Ronny, de desempenhos sofríveis, tomarem o seu lugar.
Jayme, autor do golaço contra o Moto Club (MA), que manteve o Remo com boas perspectivas de classificação, corre também risco de ficar em segundo plano. Há o discurso recorrente entre os técnicos de que um time tem mais do que 11 titulares. História quase sempre para boi dormir. É o chamado “migué” para disfarçar preferências inconfessáveis ou difíceis de explicar.
Pelo que fez nos 20 minutos finais em São Luís (MA), a lógica aconselha que Jayme entre de vez no time, seja no centro do ataque ou como ala direito. Com ele, a equipe fica mais leve e ágil.
Goiano tem a chance de ir contra a rotineira – e preguiçosa – teoria de não mexer em times já desenhados, tratando de arranjar um lugar para o herói do Castelão.
Blog do Gerson Nogueira, 30/08/2017