Rafael Jaques orienta os jogadores antes de iniciar o treino
Rafael Jaques orienta os jogadores antes de iniciar o treino

Aos 44 anos, o gaúcho Rafael Jaques tem no Clube do Remo seu principal desafio na até aqui curta carreira de treinador profissional. Depois de 2 anos no São José (RS), ele terá a primeira experiência no comando de um clube de massa.

Após passar 9 dias no curso de treinador da CBF, ele reassumiu o Leão na sexta-feira (20/12) e não vai mais deixar o clube, literalmente. Nem nas folgas de Natal e Ano Novo ele deixará Belém, já que a família deve chegar à capital paraense nos próximos dias.

De fala pausada, sempre dando a entender que analisa várias vezes o que vai dizer, Jaques garante estar plenamente ciente do que é comandar um clube tradicional e que não vive dias de relevo nacional há anos. Segundo ele, a convivência em Belém, junto aos torcedores, tem sido benéfica para esse entendimento.

“O mesmo sentimento que o torcedor tem, também tenho. Juntos, queremos subir”, afirmou.

Jaques iniciou carreira em 2018 no próprio São José (RS), onde liderou a campanha do acesso para a Série C. Antes, treinava o Sub-20 do clube gaúcho. No time principal, foi campeão da Copa Paulo Sant’Anna, da Recopa Gaúcha e do Campeonato Gaúcho do Interior, tudo em 2018.

Este ano, ele foi adversário do Remo em duas oportunidades na Série C. Na partida de ida, venceu por 1 a 0. No jogo de volta, o Leão saiu-se melhor com 2 a 0.

Jaques falou do atual momento do futebol nacional, da influência dos excelentes trabalhos dos treinadores estrangeiros no Brasil em 2019, da nova experiência em uma realidade totalmente diferente, da montagem de um novo elenco e de como vem sendo tratado pelo torcedor azulino.

Esse ano, Jorge Jesus e Jorge Sampaoli mexeram com o futebol brasileiro, trouxeram um olhar mais ofensivo e dinâmico a seus times, sendo campeão e vice nacionais. O quanto dá para tirar de exemplo do trabalho desses dois técnicos estrangeiros?

A gente tem que tirar proveito da qualidade desses treinadores. Eles são muito bons. Jorge Jesus e Sampaoli são bons profissionais, são ótimos profissionais no futebol brasileiro, no futebol argentino, no futebol português e europeu. Temos que tirar proveito do que trazem para cá, mas precisamos também valorizar nossos profissionais. Tivemos outros técnicos de fora que vieram para cá e que não foram tão bem. Quem é bom, é bom em qualquer lugar, se adapta e consegue trabalhar. É o caso desses dois. Conversamos sobre isso no curso.

Você procura observar outros times e treinadores, daqui ou de fora do Brasil, para extrair algumas coisas para os times que comanda?

Tem alguns treinadores e clubes que admiro bastante, mas temos que ver bem as características da região onde você trabalha. Por exemplo, aqui no Remo temos uma torcida apaixonada em um campeonato sob chuva e em campos pesados. Então, em alguns momentos, pode ser que tenha que abrir mão de alguns desejos para jogar conforme o cenário apresenta.

Você recebeu uma base do ano passado e está montando o elenco com mais alguns reforços. O que esperar desse Remo, uma forma de jogar parecida com a de 2019 ou algo totalmente novo?

A base da Série C não é tão grande. Tem o Vinícius, Fredson, Rafael Jansen e o Eduardo (Ramos), jogadores que enfrentei. Não foram muitos os que enfrentei, mas os acompanhei. São atletas muito importantes e por isso continuam aqui. Tenho a subida de alguns meninos que têm mostrado muita qualidade e precisam mostrar isso nos jogos, e os que estão chegando, que têm que se adaptar. Esses jogadores têm que se adaptar ao que quero e como se joga aqui.

A maioria dos jogadores que vêm dar entrevista no Remo falam sobre a intensidade dos treinos, a busca por um time que esteja quase sempre com as linhas altas, marcando sobre pressão. Como aliar uma forma de jogo que exige bastante fisicamente sem um tempo adequado de preparação?

Entrando na parte física, entendo que os jogadores que no ano passado tiveram uma quantidade maior de jogos saem na frente dos que entraram pouco em campo. A gente vê equipes no futebol brasileiro que não contratam jogadores que já passaram por cirurgias ou têm um número de jogos baixo. Em nosso caso, até pelas nossas condições, temos que ter confiança nos atletas. Fredson, por exemplo, teve um bom número de jogos, Wesley nem tanto, então um tem um lastro físico maior que o outro. Para o dia 18/01 (estreia no Parazão), ainda estaremos longe do que queremos. Isso leva tempo.

O futebol brasileiro é mais lento que o europeu? Isso é reflexo de que nossos jogadores são mais lentos ou é uma característica do futebol jogado aqui?

Não diria que o jogador brasileiro é mais lento. Aqui no Brasil se treina mais que lá fora e tem gente que leva preparador físico para Europa para se manter. Sei porque passei 6 anos fora. Lá, o que beneficia é o clima. Na Europa, todos os campos são muitos bons, com grama baixa e úmida. Todos os campos são bons. Aqui, temos temperaturas de 35° e de 5°. Por isso, a gente vê o Grêmio (RS) na Libertadores em uma correria só e, o mesmo time, uma semana depois, contra o Fortaleza (CE), por exemplo, bem mais lento. É normal isso, mas quanto a quilometragem, o jogador brasileiro corre a mesma coisa.

Nesse sentido, o calendário nacional atrapalha por tirar da maioria dos clubes o tempo para uma pré-temporada adequada?

Atrapalha um pouco sim, em especial as grandes equipes, que jogam até o fim do ano. Quando esses elencos se reapresentam, têm apenas 54 dias até o Estadual. Lá fora, eles mantêm o jogador jogando, com uma boa quantidade de partidas. Eles fazem uma boa pré-temporada e depois jogam e jogam.

Surpreendeu a estrutura montada pelo Remo, com a inauguração de um centro de preparação e recuperação de atletas (NASP)?

Quando era jogador, o Remo não tinha uma boa fama. Agora é diferente. Antes mesmo de vir, conversei com muitas pessoas que elogiaram bastante o clube. Depois, busquei mais informações e as respostas foram as mesmas. Não foi uma surpresa o que encontrei aqui, essa readequação do clube ao futebol moderno. A gente tem menos preocupação, consegue dar mais atenção ao time.

Como jogador, você esteve em clubes de massa, mas como treinador será sua primeira experiência nesse sentido. Deu para mensurar essa responsabilidade?

O Remo, pela grandeza, reestruturação e torcida que tem, o mínimo que merece estar é na Série B. O torcedor tem razão em cobrar isso, pois ele é apaixonado e ama essa camisa. O desafio atual é sempre o mais difícil e, se não tivesse tido um bom trabalho, não teria sido convidado a vir. Como jogador, convivi com a massa em outros clubes e a cobrança no dia a dia. Hoje, me sinto preparado para trabalhar no Remo. O mesmo sentimento que o torcedor tem, também tenho. Juntos, queremos subir. Diversos torcedores já me abordaram, dizem que vão me apoiar, me dão boas-vindas e dizem que querem bons resultados. Esse contato é muito bom.

Diário do Pará, 22/12/2019

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